segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Crítica literária

Mais que uma ode à democracia

Em “1984”, um apelo pelos mais primitivos direitos humanos. Na célebre obra literária de George Orwell, o “bate-na-tecla” da análise política é apenas um dos meios de conceber as idéias do ficcional(?) socialismo estruturado pelo autor de “Revolução dos Bichos”.

A narração de um mundo socialista, dividido em três superestados, surpreende pela ousadia do autor de dar um futuro possível ao conturbado século XX. Um futuro não muito otimista, porém. Escrito em 1949, o livro deve ter assustado muita gente que o leu.

Um sistema político implacável é criado pela mente de Orwell. Interessante é quão bem estruturado e bem pensado esse sistema se mostra, ao ponto de não suscitar dúvidas no leitor – a não ser as que servem ao propósito da narrativa. A história se passa em torno de um homem, Winston Smith, que se revolta contra a ideologia do sistema de governo em vigor. Todas as implicações e conflitos mentais decorrentes do poder absoluto de uma doutrina política sobre a vida do homem são explicitados de forma chocante para nossas mentes mais do que acostumadas aos ideais da Revolução Francesa.

Toda a angústia e falta de liberdade de Winston serviriam aos leitores como um incentivo à valorização eterna da pseudodemocracia capitalista. Entretanto, sobressai às discussões de questões políticas a indignação que toma nossas mentes em face da abolição dos direitos mais ordinários do homem, como o direito a pensar e a amar.

E nada de happy-end. Ou faz parte do realismo do autor ou de suas pretensões político-ideológicas de mostrar como é impraticável falar de direitos humanos e socialismo prático ao mesmo tempo. Ou as duas coisas. Uma leitura indicada para quem quer conhecer melhor o imaginado poderio de uma potência socialista evoluída – ou distorcida, doutrinariamente falando. Seja você um marxista-leninista apaixonado ou um capitalista selvagem, “1984” vale a pena. As comparações com regimes de governo reais ficam por conta do leitor. E as intenções de George Orwell com o enredo também.